USUFRUTO DEDUCTO – ESCRITURA E REGISTRO
- Por José Hildor Leal - Tabelião de Notas de Canela
- 11 de fev. de 2017
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Quando o proprietário aliena tão somente a nua-propriedade do imóvel, ocorre o que se chama usufruto deducto. Dedução, do latim “deductione” significa “ação de reduzir; subtração; diminuição; abatimento. O que resulta de um raciocínio; conseqüência lógica; inferência; conclusão”.
Logo, usufruto deducto é usufruto reservado. Se A faz doação ou venda a B, da nua-propriedade, mesmo não sendo feita menção, no título, deduz-se a reserva, porque sendo transmitida unicamente a nua-propriedade, continua titular da posse direta e do domínio útil, qual seja, do uso e da fruição, tendo alienado mero domínio direto, disposição, posse indireta.
A propriedade, quando transmitida nuda, é subtraída de atributos que lhe são inerentes, como o “jus utendi et fruendi”, isto é, o direito de usar e fruir (usus & fructus), havendo transferência apenas de parcela do domínio, correspondente ao “jus abutendi”, ou disposição e domínio direto.
Ainda que silente a escritura quanto à reserva, fica implícita a dedução (deductio), quando alienada somente a nua-propriedade. Transmitindo-se esta, é compreensível que alienou-se meramente a disposição, o domínio direto, significando que algo ficou retido, deduzido, reservado. Deducto, portanto. A esse algo se chama usufruto.
Não se pode confundir reserva e instituição, pois seus efeitos são diversos. Usufruto deducto somente existe por reserva, jamais por instituição, ou constituição. No primeiro caso (reserva) não é transferido o usufruto, enquanto que na segunda hipótese (instituição), o objeto é o próprio usufruto.
Por isso, uma vez que estava a propriedade registrada em nome de A, diga-se, para o exemplo, no R-1 da respectiva matrícula imobiliária, está implícito nesse registro que A detinha o domínio pleno do imóvel, composto de uso, gozo e disposição. Infere-se daí que o uso e o gozo correspondem ao usufruto, que juntamente com a disposição estão contidos no conceito de propriedade plena, isto é, se o proprietário tem uso e gozo, tem usufruto, que por seu turno se acha constituído, registrado no R-1, como parte integrante e indissolúvel da coisa, mesmo que dela podendo ser temporariamente destacado. Aliás, assume o nome usufruto justo quando destacado por certo tempo, pois uma vez extinto o usufruto, por qualquer das formas, a propriedade volta a consolidar-se.
Pode alguém reservar o que não possui? Ora, se o alienante reserva usufruto, é porque o possui, compreendido na propriedade, antes plena, agora bipartida.
Feita a abstração, conclui-se que sendo alienada a nua-propriedade, não precisa haver, como é praxe, novo registro para o usufruto retido, pena de redundância, “bis in idem”, duplicidade, não incidindo em tal caso a regra do art. 1.391 do Código Civil, quando dispõe que o usufruto de imóveis, quando não resulte de usucapião, constitui-se pelo registro. O código trata de instituição a terceiro, não de reserva, pelo proprietário. Assim, o uso e a percepção dos frutos, antes exercidos sobre bem próprio, passam a ser agora exercidos não mais na condição de dono, mas de usufrutuário, então sobre coisa alheia.
Ao ingressar no registro predial uma escritura de alienação da nua-propriedade, deve ser registrado somente o que foi efetivamente objeto de transmissão: nua-propriedade, pois se nada mais foi transmitido, nada mais deve ser registrado.
Para facilitar a compreensão: se, inversamente, A instituísse usufruto em favor de B, permanecendo A como nu-proprietário, tendo B como usufrutuário, seria registrado unicamente o usufruto instituído. Ou se faria um novo registro para a nua-propriedade que ficou com A? Patente que não. A nua-propriedade, no exemplo dado, permaneceria registrada no R-1. Assim como no R-1 estaria compreendido o usufruto deducto.
“Ementa Oficial: O usufruto sempre depende, por sua instituição, do registro, ainda que se tratando de simples reserva. Interpretação do art. 1.391 do novo CC. O imóvel deve ser tido como gravado por uma limitação, um ônus correspondente ao usufruto, uma servidão pessoal, e, para ser constituído e produzir toda sua eficácia, precisa ser inscrito”. CSM/SP (Ap. Civ. 99.458-0/9, j. 27.02.2003. DOE SP 14.05.2003).
Vê-se que a decisão confunde instituição e reserva, ao ensejar que usufruto somente se dá por instituição, ainda que oriundo de reserva.
Doutrina majoritária e jurisprudência não são verdades insofismáveis. O operador do direito, em especial o tabelião, ou o registrador, deve ter as suas próprias convicções, e guardado o necessário acatamento, manifestar e praticar segundo o seu próprio entendimento.
PS: texto compilado daquele que escrevi, e fiz publicar, por provocação do saudoso Antônio Albergaria Pereira, quando redator do Boletim Cartorário (Revista nº 25, ano de 2006). Volto ao tema, aqui, porque preocupou-me, outro dia, constatar que quintanistas de Direito jamais tivessem ouvido falar em usufruto deducto.
(Postado em 25 de setembro de 2010. Acesso: http://blog.notariado.org.br/notarial/usufruto-deducto-escritura-e-registro)
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